Desafios da profissão de treinador de futebol no Brasil
Quais seriam os desafios da profissão de treinador de futebol? Há muitos que são postos pelo atual mercado, alguns relacionados ao cotidiano profissional e outras às imposições do mercado, ambos, deveriam ser amplamente discutidos.
Teofilo Pimenta 18 Jan 2019 às 12h14 Comentarios
Na última segunda-feira, 14 de janeiro, comemorou-se o dia do treinador de futebol. Logo penso, ô profissão maravilhosa, porque imediatamente, lembro do que vejo na mídia, mas, como toda profissão existem os aspectos positivos e negativos, os profissionais bem remunerados e os mal remunerados.
Logo, comecei a pensar nos seguintes aspectos: quais seriam as possibilidades de acesso a formação e atualização dos profissionais, quais os interessados na inserção de profissionais brasileiros nos principais mercados internacionais, os clubes respeitam os profissionais, o sofrimento dos profissionais com a pressão por resultados imediatos, instabilidade profissional e os preconceitos sofridos pelos que iniciantes, negros e mulheres.
Para inserir-se num mercado muito desejado e cobiçada a concorrência é grande, no entanto, não é só a concorrência que está em jogo, se fosse assim, mérito, competência e preparo seriam parâmetros, mas, o ideal está longe do real.
Treinadores do seleto grupo da elite e de renome no cenário brasileiro, como: Wanderley Luxemburgo, atualmente considerado defasado, literalmente queimado, na fogueira da imprensa, logo, jugam que precisa de uma renovação nos seus métodos de trabalho e Luiz Felipe Scolari, contestado recentemente pela imprensa após o 7 a 1 contra a Alemanha na Copa de 2014, exilou-se na China, repensou e renovou sua equipe de trabalho, retornou contestado, bastou conquistar um título, readquiriu toda sua credibilidade, mas, parte da imprensa credita suas vitórias à membros, mais atualizados, da sua comissão técnica. A capacidade de gestão de uma equipe de trabalho não seria uma competência, a se destacar, desses profissionais?
Ambos com experiências internacionais, Luxemburgo treinou os galácticos no Real Madrid e Scolari treinou o poderoso Chelsea da Inglaterra e foi vencedor nas seleções brasileira e portuguesa. Qualidade e experiência estes profissionais possuem de sobra, merecem o nosso respeito. Se eles tivessem tido sucesso nas suas passagens por clubes internacionais, o mercado dos grandes centros futebolísticos seria outro para os treinadores brasileiros?
Lógico que a culpa do mercado estar fechado para o profissional brasileiro não foram os maus resultados da dupla, tão pouco a barreira do idioma, que foi explorada pela publicidade nos comerciais do treinador Joel Santana. Estas são algumas das hipóteses da complexa questão, diariamente discutida e debatida.
O mercado internacional, especialmente o dos grandes centros, seria uma pretensão ou desejo dos treinadores brasileiros, ou de parte da imprensa? Os treinadores brasileiros da atualidade não possuem méritos e competências para atuarem com destaque nos principais centros?
A imprensa discute e julga que a formação e atualização do treinador brasileiro seria o caminho para o sucesso do futebol, que a formação seria a grande causa do insucesso profissional lá fora. Ao meu ver, a formação é parte do problema, mas não o principal ou maior.
Há uma resistência e um certo enfrentamento dos treinadores da pressão exercida por parte da imprensa, que cobra por atualização para avançar e obter novos desafios, especialmente, na abertura e inserção no mercado estrangeiro, que encontra-se fechado ao treinador brasileiro, logo vem a comparação com o argentino, que possui mercado aberto, sucesso e destaque nos grandes centros futebolísticos pelo mundo.
A CBF, seguindo uma tendência europeia, recentemente criou as licenças, por meio da sua escola de formação. Nesta escola o aspirante a treinador recebe uma formação específica e os ex-jogadores, por conta da sua experiência dentro de campo, ficam dispensados dos estágios iniciais. Não seria importante todos terem a mesma formação, independente, de serem ex jogadores ou não? E a formação em nível superior, em educação física, não deveria ser um pré requisito para todos?
Uma das questões relacionadas aos aspectos estruturais é o desafio que os treinadores enfrentam como a instabilidade do cargo, um treinador dura em média no cargo cerca de 3 a 6 meses.
Seria um sonho utópico? Os treinadores brasileiros obterem experiências como a do treinador Alex Ferguson, que comandou o Manchester United por 26 anos, de 1986 a 2013. Assim, eleito o maior treinador da história do clube.
O treinador brasileiro que teve o maior tempo dentro de um clube não teve nem metade do tempo de Ferguson, recentemente Claudio Tencati comandou o Londrina-PR por quase 7 anos, de 2011 a 2017. Em 2018 experimentou a realidade do futebol brasileiro no Atlético-GO, sendo dispensado após 9 meses de trabalho no clube.
O mercado interno para o treinador profissional brasileiro de futebol tem muito preconceito, de inúmeras frentes, o profissional inexperiente sofre para se inserir no mercado, haja visto, as dificuldades de introduzir novos profissionais, casos de Osmar Loss dispensado ano passado do Corinthians e de André Jardine que tem seu trabalho, fortemente, contestado no São Paulo. É fato que o treinador iniciante passa por uma forte pressão para realizar o seu trabalho e iniciar sua carreira no futebol profissional. Outra coisa, se este candidato não ter sido jogador profissional a pressão dobra.
Outros treinadores que encontram desafios na profissão são os negros. O caso Andrade ilustra este desafio, ex-jogador do Flamengo das décadas de 70 e 80, foi auxiliar de nove treinadores no Flamengo até ter tido uma chance em 2009, aproveitou e tornou o primeiro treinador negro a ser campeão brasileiro, de quebra foi eleito o melhor treinador da competição, mas, cinco meses depois acabou demitido, mesmo o Flamengo com ele tendo obtido um aproveitamento de 70%. Após o Flamengo Andrade não treinou nenhum outro clube da série A do Brasileiro.
E com relação a mulher, Nilmara Alves, do Manthiqueira, clube empresa de Guaratinguetá, foi a primeira mulher a ter seu contrato registrado na CBF em 2018. Por algumas vezes Nilmara ressaltou o preconceito, os desafios enfrentados e dificuldades que sofreu ao longo da sua carreira. Nunca houve uma mulher no comando de um clube da elite do futebol brasileiro.
Os profissionais inseridos nos clubes da elite do futebol nacional são muito bem remunerados e expostos ao julgamento da mídia. Sofrem uma carga excessiva de estresse por parte da mídia, torcida, dirigentes e empresários. São profissionais que tem um alto grau de envolvimento com o trabalho e clube, consequência disso tudo, adoecem e se afastam do trabalho, como: Ricardo Gomes, adoeceu, se afastou e que voltou em uma outra função e Muricy Ramalho, adoeceu e tornou-se comentarista.
Por parte dos treinadores, também, há controvérsias com relação as críticas recebidas sobre se formarem e atualizarem. Renato Gaúcho, é bastante enfático quando diz: respeita quem busca, mas não vejo nenhuma novidade nos cursos existentes pelo país. Tite possuem uma visão e enfatiza a necessidade do treinador em possuir uma formação a nível superior, especialmente em educação física, para obter conhecimentos relacionados a organização dos treinamentos e cargas de trabalho, no entanto, ressalta a necessidade de aliar esses conhecimentos as vivências práticas, de dentro do campo como jogador. Ou seja, ambos destacam a necessidade de ser ex-jogador de futebol.
A partir da reflexão sobre o posicionamento desses treinadores, vejo com preconceito, veja bem, os teóricos: Cláudio Coutinho, não teve sucesso com a seleção na Copa da Argentina de 78 mas Carlos Alberto Pareira teve com a conquista do tetra com a seleção na Copa dos EUA em 1994. Sendo assim, de forma simplificada, treinador que jogou ou não jogou futebol também vai vencer e perder jogos e competições, ou seja, vitórias e derrotas em campo são diagnósticos, mas, não parâmetro para avaliar a qualidade e competência de um profissional e sua equipe.
Por fim, alguns dos desafios enfrentados pelos profissionais, da beira do campo, foram apresentados ao longo da reflexão, no entanto, a pergunta seguinte deve ser, quais seriam as possíveis saídas para o complexo jogo do mercado do futebol.
Teófilo Pimenta é professor universitário, diretor do Instituto Esporte Vale (IEVALE), profissional formado em Educação Física, especialista em Educação e mestre em Desenvolvimento Humano. Procura refletir e compreender o fenômeno esporte nas suas diferentes dimensões. Colunista no AgoraVale desde 2018.