A homofobia está em campo

O San Diego Loyal abandonou uma partida pela USL após Collin Martin ter afirmado que sofreu ofensas homofóbicas dentro de campo, colocando o tema em jogo.


Recentemente em jogo válido pela USL o San Diego Loyal abandonou o campo após seu jogador, o meio-campo Collin Martin, homossexual assumido, afirmou ter sofrido ofensas homofóbicas e discriminação dentro do campo pelo jogador Junior Flemmings do Phoenix Rising, Junior afirmou não ter cometido tais insultos.

Em meio a confusão que ocorreu no final do primeiro tempo, Collin foi expulso pelo juiz, que logo revertida sua decisão, houveram tumultos, revoltas, desacordos das equipes. O Loyal sugerido retornar a campo caso o agressor não retornasse a partida, pedido não aceito pelo treinador adversário, desta forma, a equipe de San Diego retornou o campo, todos num gesto de solidariedade a Collin se ajoelham no centro do gramado e abandonam a partida.

A decisão foi um consenso entre os jogadores e liderada pelo treinador Landon Donovan, ídolo do futebol norte-americano e técnico do Loyal, para proteger o jogador das agressões. Recentemente o clube saiu do campo nesta mesma temporada porque um outro jogador sofreu agressões racistas dentro de campo e a decisão foi a mesma após consenso de todo o grupo.

Narrados os fatos, vamos a nossa discussão sobre a homofobia no esporte, sobretudo no futebol, a partir deste recente caso o que nos chama a atenção é a constituição machista e homofóbica das sociedades pelo mundo.

O machismo e a homofobia não é algo exclusivo da nossa sociedade, quando pensamos nesta questão, logo vemos alguns acontecimentos sociais que refletem a sociedade machista e homofóbica, ora o futebol é um retrato social.

Determinadas questões sociais estão presente no futebol, o machismo está presente nos estádios de futebol, muitos leitores dirão o estádio é o espaço dos homens, no sentido vemos semelhança com a sociedade, Zeca Pagodinho, cantor popular, certa vez disse: "a rua é minha e a casa é da minha mulher", subjetivamente, ao homem tem a liberdade da rua e a mulher a limitação do espaço.

Voltamos ao futebol, as questões simbólicas retratam o machismo social, por exemplo nas torcidas organizadas há restrição das mulheres na empunhadura das bandeiras, nos instrumentos musicais e até a proibição da ida da mulheres em clássicos. Outra questão está relacionada ao desenvolvimento do futebol feminino, entre outras, observamos a limitação ao acesso das meninas, pelo entendimento dos pais que o futebol é para homens.

Sem falarmos que as atitudes machistas e homofóbicas geram uma consequência social gravíssima na sociedade brasileira, em nosso país mata-se mais pessoas da comunidade LGBTQ+ que em países onde a homossexualidade é crime. É claro que a homofobia trata-se de assunto muito amplo e que envolvem a intervenção de outras entidades sociais, neste caso o futebol pode rever suas atitudes e ajudar na construção de uma sociedade mais inclusiva e menos machista e homofóbica. Se naturalizarmos as brincadeiras homofobias, reforçamos a discriminação e o preconceito com relação a pessoa homossexual.

O britânico Justin Fashanu foi o primeiro jogador de futebol a se assumir publicamente gay na década de 90 sofreu inúmeras consequências na sua carreira e também na sua vida. Fashanu surgiu como uma promessa no futebol inglês mas logo viu o interesse pelos clubes ir embora quando assumiu publicamente sua sexualidade, seguiu sua carreira em clubes menores e desconhecido da liga inglesa. Nos momentos finais da sua vida, Fashanu escreveu uma carta para seus familiares, relatou não ter cometido o crime, mas também não esperava justiça no seu caso e se suicidou em 1998. A polícia não achou provas e a justiça arquivou seu caso.

Pouco se mudou com relação ao manifestações homofóbicas no futebol dos anos 90 para cá, são inúmeros os desafios de tornar o debate público dentro do universo machista do futebol, é necessário que entendamos a gravidade do problema e nos preocupemos em fomentar discussões e debates sobre esta e outras importantes questões.

No entanto, vemos jogadores no Brasil sendo discriminado, como no caso do Emerson Sheik que foi atacado nas redes sociais após o famoso selinho em 2013, que causou protesto, alvoroço no CT do clube, faixa com a frase: "aqui é lugar de homem" e muitos questionamentos da sua condição sexual.

O Richarlison  era criticado constantemente no seu tempo de São Paulo (de 2005 a 2010) pela torcida tricolor, que chegou ao ponto de não mais gritar seu nome antes das partidas do clube, a torcida referenciava todos os jogadores, menos o Richarlison. Outro fato marcante na sua carreira foi o protesto com bombas, de parte da torcida do Guarani, na sua apresentação ao clube de Campinas, em 2017. Richarlison na sua carreira era extremamente profissional, dedicado e comprometido com o clube, profissionalmente nunca deu margem para questionamentos, mas era estigmatizado pela sua forma de se expressar e incomodava os machistas.

No início de 2020 na apresentação do colombiano Victor Contillo, que marcou sua trajetória esportiva vestindo a camisa 24, no entanto, aconselharam Contillo a não utilizar este número no Brasil, o dirigente Duilio Monteiro Alves em tom de brincadeira o proibiu a usar este número, a brincadeira repercutiu tão mau que o dirigente teve que ir a público pedir desculpa da sua atitude, o Corinthians voltou atrás na sua decisão e o Contillo veste a 24 no clube paulista. Logo o Corinthians e sua torcida, uma das incentivadoras da inclusão da mulher nos estádios, com diversas campanhas, ainda percebemos indivíduos com atitudes preconceituosas.

Há um movimento iniciado depois da Copa do Mundo no Brasil que vem acontecendo, a FIFA criou o Fair Net Work que trata-se de um programa contra a discriminação social e racial no futebol. Assim,  a FIFA aplicou algumas multas ao Brasil pelo grito homofóbico "bicha" que ocorria na reposição de bola no tiro de meta realizado pelo goleiro, as torcidas do Palmeiras e Paysandu aboliram este grito em seus respectivos estádios.

O tema homofobia ainda é um tabu dentro da sociedade, do futebol e do esporte de uma forma geral. Vale ressaltar, alguns poucos, mas importantes movimentos de algumas torcidas organizadas, dirigentes, jogadores. Um exemplo é o da campanha realizada pelo Bahia que vem procurando realizar ações afirmativas, como: "aqui não há impedimento".

Importante as atitudes serem repensadas, mas é importante ressaltar que temos muito caminho a ser percorridos no posicionamento das questões sociais, sobretudo no tema da homofobia no esporte, vale ressaltar que há um movimentos que visam a inclusão de mulheres e homossexuais, porém, ainda tímido.


Téo Pimenta, é professor universitário e diretor do Instituto Esporte Vale (IEVALE).
Procura refletir e compreender o fenômeno esporte nas suas diferentes dimensões.
Criador do Canal Téo Pimenta no YouTube.
Colunista no AgoraVale desde 2018.