Nelson Rodrigues foi um cronista esportivo que misturou elementos da dramaturgia no futebol e suas crônicas publicadas em jornais de grande circulação nos anos 1950 a 1970 também contribuíram para transformar muito jogador de futebol em ídolo nacional.
O pernambucano Nelson Falcão Rodrigues nasceu no Recife em 23 de agosto de 1912, foi dramaturgo, jornalista, escritor e cronista esportivo. Torcedor apaixonado e assumido do Fluminense, ao assistir os jogos no Maracanã dizia que só se interessava pelo Fluminense, uma das suas maiores paixões. Igualmente em jogos da seleção brasileira dizia não se interessar pelo adversário.
Iniciou sua carreira como jornalista policial aos 13 anos no jornal do pai. Introduziu elementos da dramaturgia como: romance, drama, tragédia e comédia na crônica esportiva brasileira. Por muito tempo, em razão de um problema na visão, não enxergava nada do jogo, porém, narrava a emoção como poucos. Considerado o gênio da crônica esportiva, chamava aos que viam o apenas o jogo de forma alienada de "idiotas da objetividade e/ou cretinos fundamentais". Ele desenvolveu um olhar para outros aspectos do jogo e dizia ?em futebol, o pior cego é o que só vê a bola?.
Sua carreira jornalística foi marcada pela capacidade de refletir a construção da identidade da sociedade carioca de sua época como poucos e escrever o futebol de uma forma, exagerada, cínica e doce, como um "anjo pornográfico".
Foi um dos primeiros a mencionar o complexo de vira-latas do povo brasileiro e inaugurar a discussão sobre esse tema, que foi amplamente discutido pela sociedade, que perdura até os dias atuais. O complexo de vira-latas transformou-se num conceito para explicar algo relacionado a sensação de inferioridade do povo brasileiro frente a outras nações, em especial, as ocidentais.
A crônica "O Complexo de Vira-latas" foi publicada no Jornal Manchete Esportiva em 31 de maio de 1958, vésperas da Copa da Suécia, o texto expressava a desconfiança do povo, o temor por mais um fracasso da seleção em copas. Mas especialmente, Nelson Rodrigues tinha o temor que essa sensação do povo transpasse-se aos jogadores da Seleção Brasileira na Copa que se inaugurava. Na ocasião o Brasil vinha do marcante ?maracanaço?, a derrota por 2 a 1 para o Uruguai em 1950 e ainda não havia conquistado nenhum título de Copa. Seu principal temor era que se repetisse algo parecido ou maior. Este fantasma, recente na memória do povo brasileiro na época, o assombravam.
Nelson Rodrigues ficava olhando pelo buraco da fechadura, como dizia gostar de observar, assim, conseguia enxergar a singularidade do povo brasileiro. Refletia como poucos a constituição da sociedade de sua época nos seus textos sobre inúmeros temas, especialmente a maior paixão do brasileiro que é o futebol. Escreveu crônicas narrativas carregadas de emoção sobre futebol entre as décadas de 1950 e 1970. No primeiro momento as coberturas esportivas eram feitas dando ênfase apenas aos números dos jogos, sua entrada na crônica esportiva foi num momento que os textos começaram a mudar a partir da reestruturação dos jornais para cobrir este tipo de assunto aliado ao maior espaço destinado a essas coberturas. Nelson Rodrigues participou como protagonista nesse processo que culminou no momento atual dos jornais, que investem em colunas esportivas em forma de crônicas, escritas de diferentes formas e maneiras, por jornalistas ou especialistas, caso dos ex-jogadores.
E sobre a Seleção Brasileira atualmente, fala-se que desenvolveu uma síndrome as avessas a do vira-latas, a de pitbull. Com essa nova síndrome observa-se o desenvolvimento de uma arrogância, soberba frente aos adversários, em qualquer disputa que a Seleção Brasileira entra, a imprensa brasileira a coloca como franca favorita, gerando desnecessariamente uma obrigatoriedade pela vitória.
Esta nova síndrome máscara problemas e dificulta explicações e justificativas lógicas e racionais de jogadores, staff e da própria imprensa em reveses e derrotas. Como explicar racionalmente e aprender com os casos da Espanha em 1982, da França em 1998 e até mesmo o ?mineiraço? (a derrota de 7 a 1 para a Alemanha) em 2014, a maior tragédia da seleção brasileira em todas as Copas. Neste último caso, em especial, qualquer tipo de explicação dentro de campo fica difícil aceitar, isso na minha visão romântica.
Mas há explicações lógicas, racionais e muito aprendizado com as reflexões das derrotas. Devemos nos ater as seguintes questões: o que as derrotas nos ensinam? Quais os desdobramentos das derrotas nos rumos e transformações na estrutura do futebol brasileiro? Qual debate foi construído em torno das derrotas?
Voltando ao nosso personagem, Nelson Rodrigues ao longo de sua carreia escreveu 17 peças de teatro e milhares de crônicas, algumas sobre futebol foram organizadas nos livros: "a sombra das chuteiras imortais" e "a pátria em chuteiras". Escreveu até o seu último dia de vida, numa época de rádio suas crônicas contribuíram para transformar muitos jogadores em ídolos nacionais.
Nelson Rodrigues morreu em 21 de maio de 1980, aos 68 anos, no Rio de Janeiro.