Sociólogo francês diz que mundo de hoje é idêntico ao de 1938

Para Michel Foessel, populismo e nacionalismo de hoje são os mesmos das vésperas da Segunda Guerra; líder de maio de 1968 contesta semelhanças com revoltas estudantis


O populismo e o nacionalismo como tom dos governos e das relações internacionais são temas comuns em qualquer jornal de 2019. Mas para o sociólogo francês Michel Foessel, eles são na verdade um revival contemporâneo de um fenômeno que ocorreu com força em 1938, às vésperas da Segunda Guerra Mundial.

Em entrevista ao Nexo, Foessel disse que, além do populismo e do nacionalismo, o mundo de hoje ainda questiona a democracia e vive em uma busca voraz por culpados pelas crises econômicas atuais - na Europa, os migrantes, na América do Sul e nos Estados Unidos, a esquerda e as minorias.

"A aliança entre liberalismo econômico e autoritarismo são um eco das evoluções que nós vivemos na França e na Europa tantas décadas depois", disse ele ao jornal.

Segundo Foessel, a mobilização de uma sensação de ressentimento para angariar apoiadores entre a população não é nova, mas foi a tática escolhida pelo agora presidente Jair Bolsonaro durante sua campanha eleitoral no Brasil por meio da Internet.

Para o sociólogo, sempre que há uma crise social e econômica, surgem líderes dispostos a colocar a culpa em algum grupo por ela: no contexto de 1938, os judeus. "Naquela época, os judeus são sistematicamente apresentados pela extrema direita como a causa da decadência francesa. Esse combate é apresentado em termos identitários e nacionalistas", explicou.

Ainda assim, ele acredita que nem mesmo a França está livre de políticos autoritários. "A demanda por autoridade vem crescendo há décadas: tivemos mais de 20 novas leis securitárias em 20 anos na França. Diante disso, a simples referência à República e aos direitos humanos não é suficiente. Torna-se necessário renovar uma ampla promessa democrática que envolva emancipação social", continuou.

O país de Foessel, no entanto, vive um momento de incertezas: os protestos dos gilets jaunes pelas ruas de Paris todos os sábados já geram debates acalorados entre esquerda e direita, e perderam força após alguns atos do presidente Emmanuel Macron. Um dos críticos do movimento é "Dany Le Rouge", apelido de Daniel Cohn-Bendit, líder das revoltas estudantis de 1968. Para ele, os manifestantes de hoje não são revolucionários, mas um movimento muito perigoso em direção ao autoritarismo.

Em uma entrevista ao jornal britânico The Guardian, ele - que agora é conselheiro do presidente francês Emmanuel Macron -- disse: "Esse movimento é muito diferente de maio de 68. Voltando lá, nós queríamos tirar um general do poder (Charles de Gaulle); hoje essas pessoas querem colocar um na liderança do país", em referência a certos grupos dos gilet jaunes que defendem que o ex-ministro da Defesa da França, general Pierre de Villiers, que renunciou ao cargo após um desentendimento com Macron em julho de 2017, seja o novo primeiro-ministro.

"Ninguém em 1968 fez ameaças de morte contra aqueles que queriam falar. Esse é o poder da força. Todos aqueles que estão à esquerda e estão pensando que essa é uma revolução de esquerda estão equivocados: isso está indo em direção à direita. Ouvir que os coletes amarelos que querem negociar estão recebendo ameaças de morte é uma evidência do autoritarismo de direita", finalizou.