Voos longos de baixo custo tomam conta do mercado - mas eles são realmente baratos?

Companhias aéreas europeias prometem vender passagens para viagens maiores por preços mais em conta, mas tarifas e escalas podem tirar sedução das ofertas


Parece muito bom para ser verdade, mas as companhias prometem oferecer voos longos por preços mais em conta, no mesmo modelo low cost que faz sucesso no continente europeu e nos Estados Unidos. Até então, as passagens aéreas baratas eram restritas apenas a trechos curtos, como é o caso da irlandesa Ryanair, que opera só na Europa, mas agora o mercado parece ter compreendido e aceitado a ideia de cobrar menos por longos percursos.

Na Europa, a companhia islandesa Wow Air, a alemã Eurowings e a norueguesa Norwegian Airlines estão entre as empresas que passaram a prometer economia mesmo em voos longos. No entanto, essa promessa inevitavelmente é acompanhada de tarifas: fazer o check-in antecipado tem um preço, assim como comprar algo para comer no avião, sem contar as tarifas aeroportuárias não inclusas e taxas que podem ser cobradas para agendamento de passagens.

Segundo analistas do setor, a proposta tem vantagens e desvantagens: um fator importante é que, embora os preços sejam atrativos à primeira vista, os destinos são geralmente limitados. A Pobeda, uma companhia que já opera na Rússia, oferece três partidas diárias de Londres apenas para Moscou, São Petersburgo ou Ecaterimburgo, a quarta maior cidade do país.

A Eurowings, por sua vez, se diz ser "low cost, long distance" ("baixo custo, longas distâncias"), mas a maioria dos 50 países em que voa está na Europa, apesar de oferecer embarques para os Estados Unidos, Ilhas Maurício, Tailândia, Cuba, República Dominicana e México - desde que o passageiro esteja na cidade alemã de Düsseldorf. A Norwegian vai a Nova York, Miami e Bangkok, mas possui saídas de Barcelona para destinos como Boston, São Francisco, Buenos Aires, Martinica, Montreal, Guadalupe e Santiago do Chile.

O preço, no entanto, pode compensar. O jornal britânico The Guardian fez um cálculo a partir dos voos da Pobeda de Londres para São Petersburgo, uma distância de 2,8 mil km por terra - e descobriu que o valor final é vantajoso para o cliente. A viagem, saindo no dia 29 de dezembro e voltando no dia 4 de janeiro, sai por £ 223 (R$ 1.091). Com o acréscimo de bagagem de 20 quilos - comum para quem está voando em longos trechos, ainda mais se for para a Rússia, que exige muitas roupas - e a opção de escolha do assento, o valor sobre para £ 268 (R$ 1.311).

A opção da Pobeda, no entanto, é mais barata do que a oferecida por outras companhias britânicas, como a British Airways, concluiu a publicação. O voo básico delas para o mesmo trecho sai por £ 436 (R$ 2.133), mas sobe para £ 476 (R$ 2.329) quando o cliente opta por levar uma bagagem de até 23 quilos e pela chance de escolher o lugar no avião - sem contar a comida, não inclusa.

Apesar do marketing, porém, voos econômicos não são sempre os melhores. A imprensa norueguesa, por exemplo, chamou a atenção para o fato de os aviões que a Norwegian opera entre Londres e Nova York serem modelos 787 da Boeing, que costumam operar apenas em trechos curtos.

Há ainda os voos que são mais baratos, mas possuem muitas escalas. A psicóloga Ana Carolina Oliveira, de São Paulo, conta que, por uma passagem entre São Paulo e Paris, chegou a encontrar opções mais em conta, mas que duravam até 30 horas. "Eu vi uma da Aeroméxico que fazia três escalas: uma longa na Cidade do México, outra em Barcelona e outra em Milão, e aí chegava em Paris. Por toda essa volta ao mundo, a economia era de cerca de R$ 300. Não vale a pena", explica.

"Voos diretos são mais caros, mas, dependendo do dia, das taxas extras e dos preços envolvidos entre as low costs e as operadoras normais, pode ser mais vantajoso pagar mais caro e ter um voo mais tranquilo", concorda Gustavo Mariotto, diretor da agência de viagens ViajaNet.

Ele explica ainda que a melhor passagem aérea para um possível passageiro depende das datas da viagem, da quantidade de bagagem que será levada, do lugar desejado no avião e de quando e como ele deseja fazer o check-in. "É recomendado checar cada tarifa extra na hora de comprar, porque há algumas ocasiões em que passagens com todos os serviços inclusos podem ser mais vantajosas do que pagar um pouco menos nas low costs".

Economia real, de acordo com Mariotto, pode ser feita se o passageiro levar sua própria comida para o voo (nem todo tipo de alimento é permitido dentro das aeronaves comerciais) e não se importar de se sentar longe da família, do parceiro ou de amigos.

Os voos longos de baixo custo tiveram problemas recentemente na Europa - no Brasil, ainda não há perspectiva que esse tipo de serviço funcione. Em setembro, a companhia aérea dinamarquesa Primera Air anunciou que, depois de 14 anos em operação, estava "deixando de voar por causa de uma série de eventos" que afetaram as finanças da empresa. Entre os voos mais buscados estavam os entre Londres e Nova York e Málaga até Birmingham. O fim abrupto da empresa resultou em várias pessoas com as passagens nas mãos, mas sem voos.

A Norwegian, por sua vez, ainda que seja hoje a oitava maior companhia aérea da Europa, lidera as listas de reclamações de consumidores em vários países do continente. No segundo trimestre deste ano, a norueguesa foi a que mais transportou pessoas pelos países europeus: 526 milhões, seguida pela TAP, de Portugal (430 milhões), e pela Ryanair (319 milhões).

O Brasil

A mesma Norwegian anunciou em outubro que recebeu autorização da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para operar voos comerciais no Brasil. Em nota à imprensa, a companhia disse que está "satisfeita que a permissão nos foi dada para voar entre o Brasil e o Reino Unido, por parte das autoridades brasileiras".

"O Brasil tem um grande potencial e acreditamos que os novos voos com preços baixos vão permitir que um número maior de pessoas possa voar, incentivando o turismo e as economias locais", completou. Segundo os planos divulgados pela própria empresa, a ideia é oferecer passagens aéreas baratas para três destinos iniciais: São Paulo, Rio de Janeiro e Fortaleza.

Outras empresas aéreas de baixo custo também miram o Brasil: em setembro, a Sky Airline enviou um pedido para a Anac para operar voos entre o Brasil e o Chile. Ela já possui autorização jurídica para funcionamento desde 2013, mas ainda não havia obtido permissão operacional. A Avian Líneas Aéreas, subsidiária da Avianca na Argentina, tem autorização desde julho deste ano para operar, mas apenas voos não regulares. Já a Fly Bondi, também da Argentina, recebeu permissão em julho do ano passado e pretende entrar em breve com pedido para operar a partir de 2019.