Justiça manda Prefeitura de São Paulo alterar nomes de ruas que homenageiam figuras da ditadura militar
A prefeitura tem 60 dias para apresentar um cronograma de implementação de uma política pública para a renomeação de diversos logradouros e equipamentos públicos
A Justiça de São Paulo determinou que a prefeitura da capital altere os nomes de ruas e espaços públicos que homenageiam figuras ligadas à ditadura militar. A decisão foi tomada pela 3ª Vara da Fazenda Pública em resposta a uma ação civil pública movida pelo Instituto Vladimir Herzog e pela Defensoria Pública da União.
A prefeitura tem 60 dias para apresentar um cronograma de implementação de uma política pública para a renomeação de diversos logradouros e equipamentos públicos. Entre os locais que deverão ser alterados estão:
Crematório Municipal de Vila Alpina (Zona Leste): Homenageia um ex-diretor do Serviço Funerário que estudou métodos de cremação durante o auge das práticas de desaparecimento forçado.
Centro Desportivo na Rua Servidão de São Marcos (Zona Sul): Nomeado em referência a um general ligado ao Centro de Informações do Exército (CIE).
Marginal Tietê/Avenida Presidente Castelo Branco (Zona Norte/Centro): Nome do marechal e primeiro presidente após o golpe militar de 1964.
Ponte das Bandeiras (Zona Norte/Centro): Nome alterado para homenagear um ex-diretor do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS).
Rua Alberi Vieira dos Santos (Zona Norte): Homenagem a colaborador do CIE, envolvido em repressão violenta.
Rua Dr. Mario Santalucia (Zona Norte): Nome de médico-legista associado a laudos necroscópicos fraudulentos.
Praça Augusto Rademaker Grunewald (Zona Sul): Vice-presidente durante o período mais repressivo da ditadura.
Rua Délio Jardim de Matos (Zona Sul): Militar e um dos principais articuladores do golpe de 1964.
Avenida General Enio Pimentel da Silveira (Zona Sul): Associado ao DOI-CODI, unidade ligada a tortura.
Rua Dr. Octávio Gonçalves Moreira Júnior (Zona Oeste): Delegado envolvido em torturas e ocultação de cadáveres.
Rua 31 de Março (Zona Sul): Nome que faz referência à data do golpe militar de 1964.
A ação destacou que leis e programas municipais, como o Programa Ruas de Memória (Lei nº 15.717/2013 e Decreto Municipal 57.146/16), já previam a renomeação desses locais, mas a prefeitura não tomou medidas efetivas.
O juiz Luís Manuel Fonseca Pires justificou a decisão afirmando que a omissão da prefeitura fere princípios constitucionais e que o "direito à memória política" é essencial para a democracia e a dignidade humana. "O direito à memória política apresenta pouca ressonância nas políticas públicas, apesar de sua ampla legitimidade jurídica", afirmou o magistrado.
Em nota conjunta, o Instituto Vladimir Herzog e a Defensoria Pública da União destacaram que a decisão representa um avanço no enfrentamento aos legados autoritários no Brasil e na consolidação de valores democráticos.
A prefeitura informou que ainda não foi notificada oficialmente e avaliará as medidas cabíveis.
A última mudança de nome semelhante ocorreu em 2021, quando uma rua na Zona Oeste deixou de homenagear o delegado do DOPS Sérgio Fleury, acusado de torturar o frei Tito de Alencar Lima, e passou a se chamar Rua Frei Tito.
Atualmente, São Paulo possui 48.717 endereços registrados, dos quais 610 homenageiam membros das Forças Armadas. Coronéis, generais, sargentos e majores correspondem à maioria das denominações militares. A decisão judicial busca, além de readequar as homenagens, promover a justiça de transição e fortalecer a memória histórica.