De Napoleão a Lévi Strauss: os 200 anos da calça jeans

Oriunda do denim, um tecido das classes populares francesas, a peça mais usada no mundo foi pensada para mineiros californianos do século XIX


Do escritório à oficina mecânica, da repartição pública ao banco de motorista, do presidente ao gari, todo mundo usa calça jeans em algum momento do dia ou da semana. O tecido, com dois séculos de história, é parte fundamental da modernidade, e uma das roupas preferidas da geração millennial - justamente aquela que deixou de exigir o uso do terno e gravata todos os dias para poder usar mais... jeans.

Segundo estilistas e modeladores, a tradição do tecido é grande por sua praticidade e versatilidade, já que é bem aceita em casa, numa festa ou num grande evento social, e cai bem com camiseta, com camisa, com terno, com blusa ou com bata. Mais do que moda, a cultura jeans também pode ajudar a entender o progresso industrial, econômico e social dos países no Hemisfério Norte durante o século XX e a sua consequente penetração nas culturas do Sul.

A calça jeans, ao contrário do que muitos pensam, é francesa. Surgida no final do século XVIII, ela é oriunda do denim, um tecido robusto feito a partir de seda e lã de animais, como ovelhas, usado pelas classes populares de Nîmes, na região sul da França (713 km de Paris), e que era conhecido na Europa como o tipo de roupa característica da cidade. 

O denim também tem uma importância histórica para a França: surgido no contexto da Revolução Francesa (1789-1799), ele era um tecido que, muito parecido às roupas dos aristocratas e do séquito que vivia ao redor do rei, era muito mais barato, e por isso vestia o "homem comum" francês - aquele que estava nas ruas contra os nobres. 

A palavra "jeans" só foi usada para batizar o denim anos mais tarde, e por causa de uma piada entre franceses e italianos: a palavra era uma maneira de satirizar tudo o que vinha de Gênova, quase na fronteira com a França, no norte da Itália. Antes uma cidade autônoma, Gênova foi tomada por Napoleão Bonaparte em 1797 e anexada ao território francês, que passou a enviar toda sorte de produtos para a nova posse - entre eles, o denim. Foi na Itália que o tecido francês ganhou sua cor famosa, o índigo. 

O jeans se tornou famoso no mundo todo, porém, na metade do século XIX, por causa do alemão Levi Strauss, que saiu de uma pequena cidade do seu país em direção a Nova York, nos Estados Unidos. Depois de tentar - em vão - ganhar dinheiro em São Francisco, na Califórnia, durante a "corrida do ouro", Strauss abriu um armazém de produtos para ajudar os mineradores no trabalho, como pás e peneiras. Entre as mercadorias, porém, havia também calças feitas com o denim francês.

O tecido chamou a atenção de um alfaiate chamado Jacob Davis, que propôs a Levi Strauss colocar peças de metal nos lados dos bolsos, de forma que os mineradores pudessem prender as ferramentas na calça de denim. Ele também convenceu o alemão a modificar o desenho das peças substituindo os botões pelo zíper, então uma novidade nos Estados Unidos, e que ajudaria os trabalhadores na hora de urinar. Segundo o jornal New York Times, em 1873, diante da calça jeans, eles patentearam o produto - cuja loja até hoje é uma das grandes referências.