Atualmente existe um verdadeiro frenesi midiático entre os novos prefeitos e gestores públicos, os quais abraçaram as redes socais como instrumento fundamental na pavimentação da vitória no último processo eleitoral e agora as adotaram como solução perene para todos os males de governo, principalmente aqueles envolvendo a falta de popularidade e credibilidade. A internet passou a ser tratada como um ente fantasmagórico, que não está sujeito a quaisquer normas ou legislação que regulamentam a comunicação institucional, fundamentada no princípio de impessoalidade e proibitiva na prática da promoção pessoal, freio basilar da separação entre a figura do agente político e administração pública. Aparentemente, consideram o meio cibernético como um mundo à parte da divulgação concreta, que se faz valer por jornais, informativos e revistas impressas, outdoor, rádio e TV, entre outros, confeccionados criteriosamente para não deixar quaisquer rastros de possíveis divulgações personalistas. Porém, esquecem-se que as publicações em Facebook e Instagram detêm a tecnologia para documentar a primeira postagem, com data, dia e horário, inclusive arquivando a identidade de possíveis patrocinadores/impulsionadores de links.
Ainda, possibilitam o rastreamento de computadores e seus IPs, que já fazem parte da rotina investigativa de órgãos fiscalizadores, tais como o Ministério Público e Polícia Federal.
Diversos alcaides se agarram à premissa de que há diferenças significativas entre páginas privadas e oficiais. Mas como definir tais limites, quando o formato e mote adotados por ambas são alimentados e conceituados pela mesma equipe? Principalmente pelo motivo dos conteúdos serem administrados por assessores detentores de cargos providos pela municipalidade, com o objetivo de massificar as informações a respeito dos programas sociais, e talvez ainda mais grave, com a imagem do chefe do executivo circulando entre páginas e perfis, com origem que as remetem aos cofres públicos.
Outra questão relevante está relacionada à confecção de vídeos, através da utilização de carros oficiais e produzidos com trabalho humano, material e logístico disponibilizados pelo erário municipal, com tomadas em equipamentos pertencentes à coletividade. Tal evento não estaria sujeito à prestação de contas e devida contabilidade da comunicação institucional, mesmo que tenham sido divulgadas em redes particulares? Ou melhor, esse fato não configuraria o desvirtuamento da obrigação de dar amplo conhecimento à sociedade das políticas e projetos do poder Executivo de maneira isenta, imparcial e transparente?
Acreditamos que as plataformas e tecnologias digitais também estão inseridas nos objetivos de informar, educar, formar ou orientar a coletividade, portando devem ser tratadas como um veículo de divulgação passível de estar ao alcance das restrições jurídicas. Tal como no marketing político, onde o publicitário necessita possuir um bom conhecimento de legislação eleitoral, os comunicadores digitais terão que brevemente compreender os limites que serão impostos ao ambiente virtual na edificação de vias de diálogo junto à sociedade, sob pena de transformar os atuais gestores da coisa pública – que nesse momento vêem as redes sociais como espaço de redenção perante o inconsciente popular – em réus por abuso na promoção de imagem pessoal. Evidentemente as restrições impostas pelos princípios da impessoalidade podem ser mitigadas em determinadas excepcionalidades, porém, por via de regra, os atos da administração não devem ser apropriados indevidamente como ferramenta de autopromoção.
A partir de hoje está dada a largada na corrida entre advogados, que buscarão entender os mecanismos e meandros do descomedimento da difusão virtual com a finalidade de impingir dolorosos processos penais a gestores deslumbrados pelo mundo imaginário de Dr. Parnassus, e os verdadeiros estrategistas de comunicação, que através da capacidade criativa em produzir narrativas inovadoras associadas ao bom senso normativo, protegerão os atuais prefeitos de graves infortúnios porvindouros.
Nilton Tristão é cientista político do Instituto Opinião Pesquisa; e Luiz Felipe Lobato é secretário de Assuntos Jurídicos de São Sebastião