STF pode decidir hoje sobre legalidade de ensino domiciliar

Disputa coloca em lados opostos pais que desejam educar seus filhos em casa e o Poder Público, que defende a obrigatoriedade da matrícula e frequência escolar de crianças e adolescentes


O Supremo Tribunal Federal (STF) deve decidir nesta quinta-feira (6) o julgamento sobre a educação domiciliar, conhecido também como homeschooling, que é a possibilidade de pais darem aula a seus filhos em casa, sem matriculá-los numa escola. O processo sobre o assunto chegou a entrar na pauta de 30 de agosto, mas teve seu julgamento adiado pela presidente do STF, ministra Cármen Lúcia e foi remercado para hoje.

O debate aguarda uma decisão, desde 2015, por meio de uma determinação do STF. A disputa coloca em lados opostos pais que desejam educar seus filhos em casa e o Poder Público, que defende a obrigatoriedade da matrícula e a frequência escolar de crianças e adolescentes.

O governo considera a prática desfavorável para a socialização das crianças e adolescentes, mas a prática é vista com normalidade em outros países. Órgãos públicos alegam que educar fora da escola retira do Estado e entrega para a família a responsabilidade pela educação.

No entanto, defensores do homeschooling não concordam com a ideia da socialização levantada. A prática da educação em casa tem como base escola ideal para que se evite o que o estado não consegue combater, como os casos de bullyng, ideologias de gênero ou partidárias e violência, etc. e que a família tem o direito de escolher o melhor método de instrução a ser ministrado aos filhos.

O processo em discussão no Supremo terá como relator o ministro Luís Roberto Barroso e deve estabelecer uma diretriz válida para todos os casos do tipo que tramitam na Justiça brasileira - a chamada repercussão geral.

Educação domiciliar - De acordo com Associação Nacional de Educação Domiciliar (Aned), o número de famílias que optam pela educação em casa tem crescido no Brasil. Em 2018, chegou a 7,5 mil famílias, mais que o dobro das 3,2 mil famílias identificadas em 2016. A estimativa é de que 15 mil crianças recebam educação domiciliar no país atualmente.

AGU é contra - A  Advocacia-Geral da União (AGU) se posicionou contrária à autorização desse modelo de educação. Para a AGU, as normas brasileiras estabelecem que a educação deve ser oferecida de forma gratuita e obrigatória pelo Poder Público.

A AGU entende que nenhum núcleo familiar será capaz de propiciar à criança ou ao adolescente o convívio com tamanha diversidade cultural, como é próprio dos ambientes escolares. A Procuradoria-Geral da República considera que a educação familiar não encontra amparo na Constituição.

A Aned e famílias que defendem o homeschooling argumentam que a educação domiciliar garante o direito à dignidade e ao respeito, assegurando uma educação mais individualizada e, portanto, mais efetiva. Dizem ainda que a própria Constituição dá margem para que os pais e responsáveis eduquem os filhos quando assegura a educação como direito de todos "e dever do Estado e da família".

Entenda o caso - O parâmetro para os demais foi levado ao Supremo pelo microempresário Moisés Dias e sua mulher, Neridiana Dias. Em 2011, o casal decidiu tirar a filha de 11 anos da escola pública em que estudava no município de Canela (RS), a aproximadamente 110 kms de Porto Alegre, e passar a educá-la por conta própria.

Os pais da menina alegaram que a metodologia da escola municipal não era adequada por misturar, na mesma sala, alunos de diferentes séries e idades, fugindo do que consideravam um “critério ideal de sociabilidade”. O casal disse que queria afastar sua filha de uma educação sexual antecipada por influência do convívio com colegas mais velhos.

A família argumentou ainda que, por ser cristã, acredita no criacionismo – crença segundo a qual o homem foi criado por Deus à sua semelhança – e, por isso, “não aceita viável ou crível que os homens tenham evoluído de um macaco, como diz a Teoria Evolucionista [de Charles Darwin]”, ensinada na escola.

A Secretaria de Educação de Canela, ordenou a “imediata matrícula” da menina em uma escola. O Conselho Municipal de Educação também deu parecer contra o ensino domiciliar, “por não se encontrar regulamentado no Brasil”.

O casal recorreu à Justiça, mas teve negado um mandado de segurança em primeira e segunda instâncias.